sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Toca a marchar!

Confortavelmente sentado na poltrona da sua salinha de estar, Polidoro, ouvia atentamente o noticiário das 20 horas. Tinha que entregar no jornal a crónica para o dia seguinte e ainda não lhe surgira assunto relevante que merecesse ser comentado. Já se tinha posto em pé, várias vezes, percorria o corredor de uma ponta a outra, entrava na cozinha, abria o frigo, metia mais uma pedra de gelo no copo e fitava preocupado o gargalo da garrafa empinada onde as últimas gotas do precioso líquido dourado se escoava amarguradamente. Voltou para a sala e voltou a acomodar-se frente ao televisor. - Parece que chegou o dia de usar o meu último trunfo - pensou ele em voz alta. Tem-no ciosamente guardado para o dia em que não encontre pessoa ou coisa para criticar. Nesse dia dirá mal de si mesmo. Até já engendrou a estrutura. - Alto lá! Eureka! Tinha aparecido no ecrã um dirigente duma associação de militares queixando-se da falta de sensibilidade e desconsideração de que os militares têm vindo a ser alvo, nos últimos anos. - Olha, olha! Cá está, como não me lembrei disto há mais tempo? Agarra imediatamente no bloco de papel quadriculado e na lapiseira que lhe foi oferecida quando era secretário de estado da cultura por um grupo de teatro como reconhecimento pelo trabalho desenvolvido em prol desta forma de arte, e desata a escrever furiosamente, como só ele sabe. É um autêntico bulldozer! As Forças Armadas devem ser “uma força essencialmente obediente como em toda a parte o Estado a obrigou a ser”. Não faz nenhum sentido mandar “missões de paz” para a Bósnia, Kosovo e Afeganistão. (Porquê as aspas?) As associações de militares são corporativistas. Os militares devem ficar dentro dos quartéis. Os militares não devem reivindicar dado que o passo seguinte é a política. Os militares devem ser apolíticos. Votam no sacristão da paróquia. As Forças Armadas só devem ter privilégios em tempo de guerra. Próteses e funerais participados a 50%. As associações são verdadeiros sindicatos. Só lhes falta fazer greves, pois já houve quartéis ocupados por revoltosos, o desprezo pela cadeia hierárquica é frequente, a desobediência às ordens fazem parte do dia a dia e, da assiduidade e da pontualidade nem se fala. Os militares devem estar mudos e quedos. Mesmo que lhes seja aconselhado procurarem outra profissão. Escreveu e mandou para o jornal. A empregada foi entregar em mão, pois tem horror aos pc’s, às net´s e aos emails. Prefere as enciclopédias. No fim de semana que vem vai a Constância visitar o Camões. Vai meter-lhe uma cunha para que lhe ceda alguma da sua verve. A.M.

2 comentários:

  1. O que falta são uma guerrinhas para os militares trabalharem. Assim, ficam sem militância!
    FigasAbraço

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  2. Há muitos anos que os militares vivem sem "Cabeça". Uma delas (cabeça) só pensou em submarinos, outra só participou em desfiles, e a actual é apenas comissário político do governo. Digo eu, que sou uma besta ao quadrado!
    Abraço

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